terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A " Chama"...

Conforme o meu tempo histórico se esvai, tenho considerado, refletido e desenvolvido cada vez mais a seguinte tese: Está próximo o tempo em que um dos poucos critérios que dufereniarão os seres os "humanos" será o da manutenção da "chama interior" da indignação frente as " dores " do mundo.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Te louvo Força Criadora, Inteligência que ordena a Evolução, Motor que move sem ser movido, Fogo que queima sem consumir!

Medito: qual seria a melhor forma de te honrar pela dinâmica da vida e alma? Pelas cores da natureza, tua criação?

A única resposta que me vem a mente por pura intuição e incrivelmente, acompanha o compasso do cor...ação, amar, amar, amar, amar...

Que não se submete a dogmas, pelo contrário, os subverte.

Sopra onde quer e como quer, desafia a sanidade de nossa fragil emoção enos provoca a viver.

Como te honrar, teimo em meditar.

A única resposta que me vem a mente por pura intuição e incrivelmente, acompanha o compasso do coração, amar, amar, amar, amar...

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Chegando no Blog uma contribuição muito significativa da Aline Gonçalves, minha querida prima.

Muito bem, obrigada!

“O desafio foi lançado: cá estamos mulheres, com toda vivacidade e esmero que nos caracterizam: chegar aos trinta, muito bem, obrigada!
A tarefa não é nada fácil, e nem é pra ser. O fato é que chega uma hora em nossas vidas que, nos voltamos para dentro de nós, para nos lançarmos novamente, agora, um pouco mais diferente do que éramos ainda lá na casa dos vinte e poucos. Essa tal “introspecção”- já dizia Jung - acontece justamente aí, na casa dos trinta. Curioso, não?! Curioso e necessário. Eu diria mais: necessariamente visceral. Poeticamente bonito, e árduo ao longo dos anos. Mas, nada impossível para nós, mulheres!
Foi-se o tempo em que a obrigação tornava-se tema central e determinante às mulheres que deveriam de alguma forma, chegar aos trinta de filho no colo e avental à frente do corpo – sinalização clássica de uma mulher submissa, arcaica e culturalmente subestimada. Respeito aquelas que ainda vivem sob essa condição, mas, não é disso que quero me privilegiar aqui.
Para as mais resolvidas, chegar aos trinta é simplesmente glamour! É atingir a melhor fase da vida já vivida, é chamar o desafio pra mais perto e poder encará-lo com toda a experiência que te carrega, é ter a honra de poder refletir melhor e com mais qualidade emocional o nosso papel nessa missão finitamente possível, que é viver!
Chega de me atrasar! Não quero nunca mais parar de aprender comigo mesma! Quero brindar com o sorriso estampado e o brilho nos olhos os meus merecidos trinta anos! Quero representar com orgulho essa classe de mulheres guerreiras capazes de fazer história por onde passa e com quem se relaciona.
Quero me emocionar com o que há de mais simples e belo na vida com toda a fragilidade e sensibilidade de uma mulher em toda minha essência, sem ao mesmo tempo, ser fraca e incrédula aos meus sonhos! Ah, sonhar! Palavrinha-chave essencial na bagagem longa que me fez chegar aos meus trinta anos, muito bem, obrigada!
Quero degustar o prazer de viver meus dias assim! Venço-me. Vivo! Tudo só depende de mim!”

Texto: Aline Gonçalves

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Uma questão de Identidade


Hélio Márcio Gonçalves da Silva[1]



Então disse Deus: "Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança. Gn 1,26




A questão da identidade interpela o ser humano desde sua criação. Vivemos momentos angustiantes com relação a esta temática.
Podemos dizer que de forma existencial, existe hoje, diante de tantos desencontros e tensionamentos, uma crise humana de identidade?
A polêmica é grande. Se para a antropologia filosófica e as demais ciências humanas e sociais a questão não é pacifica, será possível encontrarmos “portos seguros” com relação a este assunto? Quem tem a razão no debate?
Mais do que fazermos uma exposição ou fechamento sobre a posição das correntes de pensamento, percebível nas razões e des-razões de “ modernos” e pós-modernos”, quero lembrar apenas uma situação muito importante, definidora de felicidade e por que não ”sanidade” para todos nós que “ vivemos debaixo do sol”.
O ser humano não deve fugir, ou negar a sua identidade fundante. Todas as experiências de fuga, de transtorno dessa identidade fundante, original, resultaram na desumanização, ou seja, na completa descaracterização de seu ser. Mas que identidade é essa?
Diante da quantidade de conceitos, e aplicações: identidade cultural, social, funcional, institucional, grupal, etc... Pareceu-nos mais interessante eleger a identidade pessoal como característica mais profunda do que buscamos compreender nesta pequena reflexão.
Segundo Clara Costa Oliveira , “Parece irrefutável que a identidade pessoal emerge sobretudo da percepção interna (em linguagem filosófica) que os indivíduos humanos possuem de si próprios, ou das representações neurais que os indivíduos constroem de si próprios (em linguagem mais científica). Sendo, no entanto, os seres humanos organismos de terceira ordem (Maturana e Varela, 1972), temos que eles produzem a representação sobre si próprios inseridos em comunidades nas quais vivem, ou seja, as representações identitárias sobre nós próprios emergem (em indivíduos saudáveis) de co-construções que ocorrem nos sujeitos-nichos que constituem unidades complexas.”[2] Ou seja, como nos caracterizamos, percebemo-nos e mostramo-nos. Daí que o grande problema da “ crise de identidade” existencial humana seria o inverso, qual seja, a des-caracterização, a falta de percepção de si mesmo, a alteração do ser ( vir-a-ser-outro).
A Bíblia nos mostra vários exemplos dessa des-caracterização, ou seja, desse des-caráter, “ ficar sem cara”, sem o rosto que nos identifica. Saul foi um deles, perdeu essa identidade. Depois de ficar com raiva e inveja de Davi, “No dia seguinte, um espírito maligno mandado por Deus apoderou-se de Saul e ele entrou em transe (transtornado, surtado, descaracterizado)[3] em sua casa, enquanto Davi tocava harpa, como costumava fazer. Saul estava com uma lança na mão e a atirou, dizendo: Encravarei Davi na parede”. Daí em diante só ocorreram perseguições insanas e desespero a ponto de se chegar ao suicídio, a mais completa descaracterização humana. Outros casos de ira e inveja, traição e remorso, se repetem. Pedro sente vergonha, remorso, se esconde em si mesmo após “negar” o Mestre, tanto é que somente se reabilita após afirmar realmente seu amor por Jesus (Jo 21). Mas o mais profundo, o mais constrangedor, talvez pelo fato de ser o primeiro, é a situação vivenciada por Caim.
“O Senhor aceitou com agrado Abel e sua oferta, mas não aceitou Caim e sua oferta. Por isso Caim se enfureceu e o seu rosto se transtornou[4]. O Senhor disse a Caim: "Por que você está furioso? Por que se transtornou o seu rosto? Se você fizer o bem, não será aceito? Mas se não o fizer, saiba que o pecado o ameaça à porta; ele deseja conquistá-lo, mas você deve dominá-lo". Disse, porém, Caim a seu irmão Abel: "Vamos para o campo". Quando estavam lá, Caim atacou seu irmão Abel e o matou” Gn 4,4-8. Na narrativa vemos a des-caracterização, originada no ódio que gera a violência, o assassinato. O ser humano, como imagem e semelhança do Criador, em sua identidade original, não vivencia a violência, mas quando a inveja e o ódio, o transtornam, daí, “ esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ter se consumado, gera a morte.” Tg 1,15 .
É muito importante notar que Caim tem a chance de se definir em relação ao pecado, ao ódio que gerou a morte de seu irmão: “saiba que o pecado o ameaça à porta; ele deseja conquistá-lo, mas você deve dominá-lo". A possibilidade de escolher entre o bem e o mal Deus nos lembrará novamente em Deuteronômio 30,15, "Hoje invoco os céus e a terra como testemunhas contra vocês, de que coloquei diante de vocês a vida e a morte, a bênção e a maldição. Agora escolham a vida, para que vocês e os seus filhos vivam”. Daí para frente tudo vai depender de quem esta mais fortalecido e alimentado dentro de si. Se alimentarmos o bem, conservaremos nossa identidade, ao passo que com a opção pelo mal, mudamos nosso rosto, encobrimos nossa identidade, nos transtornamos.
A questão da identidade é percebida também nos momentos que verificamos o seu realce, a sua afirmação. A Bíblia sustenta que Moisés “resplandecia o rosto” , quando trouxe ao povo as tábuas da Lei. E quanto a Jesus, a verdadeira face humana do Pai “Enquanto orava, a aparência de seu rosto se transformou, e suas roupas ficaram alvas e resplandecentes como o brilho de um relâmpago” nos narra o evangelho de Lucas. E Estevão, como testemunha fiel de Jesus, ficou com a ”aparência de anjo” no momento de seu martírio.

Como já havia afirmado no inicio da reflexão só pretendo lembrar aqui nossa identidade original, conditio sine qua non para experimentarmos a felicidade, impressa no nosso verdadeiro rosto. A Escritura diz que fomos feitos a imagem e semelhança do Senhor, e que este “Senhor Deus plantou um jardim”, ora um Deus que planta, cuida, cultiva, embeleza, é um Deus jardineiro![5] Que poético e forte! Remete-nos a reflexão sobre o que temos feito, qual jardim cultivamos, que cuidado temos tido com as flores e arvores de nossa pequena vida terrena.
Em um mundo onde o desamor, o descuidado, as misérias humanas, sociais, espirituais e existenciais tem crescido gradativamente, podemos com certeza responder a pergunta expressa no inicio do texto:sim, existe uma crise identitária humana com certeza. Mas não é de hoje, é de sempre, desde o momento em que renegamos a verdadeira “imagem e semelhança do Criador”. Jesus nos ensina que renegando a imagem e semelhança de Deus, o filho pródigo ficou parecido com os porcos (nada contra esses animais) que teve de cuidar para sobreviver, até comia a comida deles! Só conseguimos fazer a experiência de retorno à identidade originária, quando temos um modelo, um ícone, um paradigma a quem podemos recorrer para nos orientar. Jesus de Nazaré, pois: “Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação” Col 1,15.
O mundo indubitavelmente precisa mais e mais de Jesus, se não for como sinal de fé, na forma religiosa, pois sempre existirão várias religiões, mas que seja como modelo, ícone, paradigma, ou como Ele mesmo definiu-se: Caminho, Verdade e Vida, o SER HUMANO em sua perfeita integralidade ontológica, única forma de vivermos plenamente nossa humanidade e voltarmos a ser parecidos com o pai, filhos do “Deus jardineiro”, que cultiva e guarda seu jardim.
[1] Professor da Rede Pública Estadual de Mato Grosso.
[2] IN: IDENTIDADE PESSOAL:Caminhos e Perspectivas . Francisco Teixeira (coordenação)Coimbra, Editora Quarteto, 2004.
[3] Grifo meu. NVI, Nova Versão Internacional.
[4] Grifo meu. NVI, Nova Versão Internacional.
[5] Gn 2,8

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Campo e Camponeses sujeitos de direitos...

Educação do Campo: caminhos a percorrer

Hélio Márcio Gonçalves da Silva*



“O discurso da globalização que fala da ética esconde, porém, que sua é a ética do mercado e não a ética universal do ser humano, pela qual devemos lutar bravamente se optamos, na verdade, por um mundo de gente.” Paulo Freire.



Falar sobre educação do Campo é acima de tudo fazer ressoarem as milhares de vozes camponesas que gritam e lutam na defesa e na resistência do Campo como espaço de vida e de cultura. De vida porque, mais do que simplesmente estarem no seu lócus, os Povos do Campo vivenciam a concepção de agricultura mais radical possível, a de cultivo com o cuidado da terra. Nesta forma de ver e se situar o camponês “afaga” a Terra, invertendo uma lógica tão perversa, e ao mesmo tempo tão comum, a da exploração unilateral, que gera o desequilíbrio ecológico e a quebra dos laços de “filiação” a “Mãe Terra”. Por outro lado, temos um espaço de cultura firmado também na resistência à massificação promovida pelos MCS embalados pela mídia mercadológica que teima em apresentar um plano desfigurante do ser humano, ridicularizando-o e sexualizando-o como um objeto de consumo barato. O campo como espaço de cultura camponesa se volta para sedimentação de valores humanos forjados na solidariedade do grupo social representada nos mutirões, nas cantigas de trabalho, nas casas de farinha e nas outras formas de produção e criação coletivas. Como diz Cândido (2001), o caipira, acostumado às dificuldades proporcionadas pelo modelo colonizatório, encontra em seu meio social, as formas solidárias de vencer as dificuldades. Todos esses aspectos abordados, tanto o produtivo, como os culturais, se caracterizam como elementos basilares para um projeto de quem almeja uma Escola do Campo com a qualidade e o perfil dos homens, mulheres e jovens camponeses.

“Quando situamos a escola no horizonte dos direitos, temos de lembrar que os direitos representam sujeitos-sujeitos de direitos, não direitos abstratos-, que a escola, a educação básica tem de se propor tratar o homem, a mulher, a criança, o jovem do campo como sujeitos de direitos. Como sujeitos de história, de lutas, como sujeitos de intervenção, como alguém que constrói, que está participando de um projeto social. Por isso a escola do campo tem de levar em conta a história de cada educando e das lutas do campo.”(ARROYO, 2004, p.74)

As Escolas do Campo nascem da história de luta dos que entendem a educação como elemento de direito, este por sua vez negado historicamente pelo Estado Brasileiro que não considerou a especificidade do campo em suas agendas de políticas públicas. Ainda, infelizmente é muito comum ouvir conversas do tipo, “para a escolinha da roça qualquer coisa serve, eles nunca tiveram nada mesmo”. Tal fala, simboliza o cúmulo da negação da cidadania. Todo projeto de Educação do Campo que nasce da resposta a está negação, terá que espelhar o que elencam as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (RESOLUÇÃO CNE/CEB), de 3 de Abril de 2002) sendo:

Art. 4º“(...) expressão do trabalho compartilhado de todos os setores comprometidos com a universalização da educação escolar com qualidade social,(...) num espaço público de investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para o mundo do trabalho, bem como para o desenvolvimento social, economicamente justo e ecologicamente sustentável.”

Ou seja, expressando uma proposta viável e atual de Cooperação, instrumentalizada por uma Pedagogia própria entendida como jeito de proporcionar a formação do ser humano, “identificando algumas práticas ou vivências fundamentais neste processo de humanização das pessoas, que também chamamos de educação”.(CALDART, 2004, p.98). E ainda:

“a educação para a cooperação e solidariedade deve então, ser pensada em seu processo, no conjunto dos elementos que compõe o processo educativo, modificando o enfoque das relações estabelecidas, para que os sujeitos possam firmar-se no interior dos grupos pelo reconhecimento e valorização dos princípios da cooperação e da solidariedade”.(BOFF, 2004, p.128).

Pensar e apresentar um programa educacional que enfoque e enfatize a solidariedade e as relações de cooperação, requer pensar também nos contextos econômicos que estão inseridos os sujeitos da Educação do Campo (p.128). Daí surge a pergunta, qual seria o “campo” da Educação do Campo? O “campo” da vida ou o “campo” da exploração, o “campo” da agricultura familiar ou do agro-negócio capitalista? Sem dúvida alguma o que a luta histórica dos Movimentos Sociais do Campo vem demonstrando, é que o modelo de exploração econômica até agora vivido no Brasil, só trouxe o atraso nas relações sociais e o subdesenvolvimento. A exemplo disso, vivemos neste momento, a prova mais explicita da insegurança gerada pelo processo globalizatório na dita “agricultura empresarial”, vivenciada no modelo que se demonstra insustentável pelas mínimas variações cambiais do mercado internacional.
Outro elemento que suscita o pensar sobre o projeto em construção de Educação do Campo, é o modelo consumista que não poupa a população camponesa. Somente com a postura cooperativa da educação poderemos superar o caráter consumista do processo operacional de nossas escolas do Campo. Lembro-me de uma situação um tanto quanto constrangedora e ao mesmo tempo pedagógica ocorrida em uma “escolinha”de um assentamento. Em uma das mais significativas festas da comunidade/escola, a diretora veio a público pedir desculpas, pois o frango “de granja” congelado e comprado no supermercado não estava bem assado devido a falta de gás. Situação que merece uma dupla reflexão pelos responsáveis de aplicação do Projeto Político Pedagógico na Escola. Em primeiro lugar, não bastaria dizer que a escola do campo é o centro comunitário e social dos Povos do Campo, se ela não cumprisse o seu papel de organização e motivação dos elementos de sociabilidade tais como o mutirão, já citado anteriormente, fazendo com que todos pudessem contribuir para a efetivação da “festa”. O outro aspecto seria o aproveitamento de situações problemas para trazer a tona os conhecimentos tradicionais da cultura campesina, fazendo uma interação com os conhecimentos universais, já destacados nos parâmetros curriculares. Um exemplo disso seria o mutirão para a arrecadação das “prendas” e a construção do forno a lenha comunitário, todos eles enriquecidos pelos professores de ciências sociais, matemáticas, biológicas, químicas, etc... Tudo isso para demonstrar o potencial cooperativo que o campo pode proporcionar ao modelo de educação. Nos versos do camponês esta experiência se traduz:

Para decifrar a Terra e seus recursos naturais.
Os valores culturais que o tempo não desfez.
O saber do camponês, o que a vida lhe ensinou,
desafia o professor para ver quem sabe mais.
Seus currículos vêem dos pais, que herdaram dos avós
dos cantos dos Rouxinóis, das plantas dos animais.

E ainda comprometendo:

Educação é cultura com expressões regionais.
Não aceitamos a postura do saber menos, ou saber mais!
Há saberes diferentes e todos são decorrentes de nossa inculturação.
Se tivermos aptidão e entendermos o Campo
Construiremos os parâmetros de uma nova Educação.
( José Santana Monte, MPA-CE)

Vale ressaltar que, um projeto assim jamais cumpriria seus objetivos sem uma proposta pedagógica de alternância, ou seja, reconhecendo na valorização do Tempo Comunidade/Família o espaço de aprendizagem, co-responsável e interativo com o Tempo Escola. Esta proposta pedagógica vem sendo vivida há quase três décadas no Brasil pelas Escolas-Família Agrícola (EFAs):

“De maneira geral, a Pedagogia da Alternância trabalha com a experiência concreta do aluno, com o conhecimento empírico e a troca de conhecimento com atores do sistema tradicional de educação, e também, com membros da família e da comunidade na qual vive o aluno e que podem fornecer-lhe ensinamentos sobre aquela realidade”.(MARTINS, s/d, texto cedido pela organização).

E ainda seguindo o pensamento de MARTINS (2004), o trabalho com a Pedagogia da Alternância também revela o potencial dos jovens agricultores se desenvolverem como atores de produção de conhecimento, a partir do momento que questionam sua própria realidade e detém os instrumentos para encaminhar a investigação de tais questões de maneira mais sistemática.

Diante dos aspectos apresentados, seria importante lembrar a importância da formação inicial e continuada dos sujeitos cooperadores na condução de um projeto voltado à realidade dos “Povos do Campo”. Um projeto integral de Educação do Campo não poderia deixar de contemplar as necessidades apontadas e vivenciadas nas realidades pedagógicas camponesas. Seria importante lembrar que os Movimentos ensinam, mas também estão inseridos no processo do aprendizado, o que fundamenta a atitude dialética da formação permanente. A proposta aqui apresentada visa além de tudo refletir sobre a necessária Pedagogia da Cooperação, enfatizada na Educação do Campo, buscando contribuir no aprofundamento dessa temática, favorecendo a pesquisa-ação e o envolvimento da sociedade no debate público e necessário sobre os direitos até então negados. Arroyo esclarece que no âmbito dos centros produtores do conhecimento, existe:

“O silenciamento, esquecimento e até o desinteresse sobre o rural nas pesquisas sociais e educacionais é um dado histórico que se tornava preocupante. Por que a educação da população do campo foi esquecida? Um dado que exige explicação: somente 2% das pesquisas dizem respeito a questões do campo, não chegando a 1% as que tratam especificamente da educação escolar do meio rural. O movimento por uma Educação do Campo nasceu para denunciar esse silenciamento e esquecimento por parte dos órgãos governamentais, dos núcleos de financiamento de pesquisas, dos centros de pós-graduação e dos estudiosos das questões sociais e educacionais”.(2004, p.8).

Relembramos neste momento o papel e a missão da Universidade que se engaja na tentativa desafiante de se fazer presente nesta luta, oportunizando à parcela significativa da sociedade uma maior inserção no mundo do trabalho e da ciência.Tal iniciativa demonstra o interesse da instituição em superar uma das falácias mais eficazes da ideologia neoliberal, que se esforça em convencer os prejudicados das economias submetidas de que a realidade é assim mesmo, de que não há nada a fazer, mas seguir a ordem natural dos fatos. “A grande força sobre que alicerça-se a nova rebeldia é a ética universal do ser humano e não a do mercado, insensível a todo reclamo das gentes e apenas aberta à gulodice do lucro. É a ética da solidariedade humana.”( FREIRE, 1996, p.129). Ética do desprendimento, da aceitação do novo e do diferente, acima de tudo ética do encontro com os “Povos do Campo” de um Mato Grosso muitas vezes esquecido. A Universidade no Estado de Mato Grosso deve celebrar uma aliança com este projeto. O projeto social dos trabalhadores /as, que são os fundadores e os gestores da solidariedade e da cooperação como projeto social, deve promover o desenvolvimento integral do ser humano, a conservação da natureza, a compaixão pela terra e pelo outro, a ética universal, o projeto do humanismo social.(ZART, 2004).
Reforçar aqui a função da Universidade Pública é fundamental, penso que a importância de seu caráter público deve ser muito mais enfatizado, pois somente assim reafirmaremos o sentido mais profundo de Res-Publicum, coisa de todos, coisa do povo. E por ser de todos, deve dar respostas aos anseios também dos Povos do Campo, como forma de assumir assim sua responsabilidade social. Termo tão confundido ultimamente que reduz a ação da Universidade a atividades de pura Extensão. Lembremos do espaço do Ensino que deve contribuir para formar seres humanos, capazes de refletir criticamente tanto sobre a ciência e as técnicas que são incorporadas pela universidade quanto sobre sua relação e sentido na sociedade e no mundo, na perspectiva de um processo emancipatório que favoreça o ser humano e preserve o meio ambiente. Autoconhecimento e conhecimento do mundo social são dimensões importantes da formação para que o acadêmico seja capaz de tomar decisões conscientes como profissional e cidadão (GOERGEM, 2005).

Finalizo lembrando Pe. Vieira, para quem o discurso de quem não viu é só discurso, o discurso de quem viu é profecia. Vieira se referia a prática dos antigos sacerdotes e adivinhos em olhar a entranhas das vitimas dos sacrifícios a fim de prever o futuro. No processo da adivinhação, não se abria a sede do pensamento (cabeça) mas a sede dos sentimentos (coração). A prática pode ser supersticiosa, mas a lógica é verdadeira. Somente quem “viu” as “entranhas” das vitimas (crianças, jovens, homens e mulheres camponesas) sacrificadas pelo modelo injusto do sistema agrário brasileiro, esquecidos pelo poder público, e negligenciados até pela academia, pode “profetizar”o que espera a Educação em Movimento dos Povos do Campo.Um espaço de vida, respeito a natureza e cidadania. É o que juntos nos propomos a construir.
Com a contribuição de vários com panheiros e companheiras,
Hélio Márcio



domingo, 9 de dezembro de 2007

" O Espírito do Capitalismo" - Max Weber

Weber inicia este capítulo elegendo como “pretensiosa” a expressão usada por ele para designar o verdadeiro Ethos do Capitalismo, o chamado “Espírito do Capitalismo”, termo este que encontra um forte significado cultural. Discorrer sobre este tema significa desenvolver uma “explanação histórica”, sem se fechar sobre uma formulação conceitual, mas somente iniciar uma descrição provisória sobre seu objeto de estudo neste caso. Adverte ainda que sua intenção inicial é de se manifestar com tranqüilidade a respeito de qualquer idéia religiosa, ficando livre de preconceitos ( p.29).
A partir da citação de sentenças proferidas por B. Franklin apresenta o que seria para ele o núcleo do Ethos do capitalismo, idéia original, que se diferencia como sendo a “qualidade” de interesse de sua obra, diferentemente de um mero “bom senso comercial”. Consegue distinguir este modo de ser e viver, pelo comprometimento na vivência de virtudes que levam ao grau de uma perfeição na honestidade e na prosperidade econômica dos pietistas. “Ganhar dinheiro dentro da ordem econômica moderna é, enquanto for feito legalmente, o resultado e a expressão de virtude e de eficiência em uma vocação: e estas virtude e eficiência são, como não é difícil de ver agora, os verdadeiros Alfa e Ômega da ética de Franklin(...)”(p.33). Discorrendo historicamente sobre o assunto Weber demonstra que a “avidez pelo ouro” sempre existiu no contexto das nações e épocas, sendo para ele, “tão velha quanto o homem” porém, esta mesma situação apresenta-se ultimamente de forma original, revestida de um novo caráter, o caráter racional que envolve a modernidade. Neste sentido, o oponente mais importante que o “Espírito do Capitalismo” como estilo normativo de vida tem que reagir, seria justamente o tradicionalismo econômico ligado a idéia da “necessidade de sobrevivência”e “aquisição( p.37 e 41). Para ilustrar esta situação, traz os exemplos de trabalhadores e trabalhadoras em diversos níveis e categorias e seus respectivos comportamentos em relação a salários e modos de trabalho. Um aspecto interessante a ser abordado, é a afirmação de que com as trabalhadoras metodistas “as oportunidades de superar o tradicionalismo aqui são muito grandes devido a educação religiosa. Esta observação do capitalismo contemporâneo sugere por si mesmo a validade da interrogação de como esta conexão de adaptabilidade do capitalismo a fatores religiosos pode ter surgido na época do seu desenvolvimento inicial”( p.40). Todas estas afirmações remetem a idéia de superação de um modelo aventureiro e sem base racional para uma concepção firme, sóbria, e ascética de um novo jeito de ser e experienciar a prosperidade econômica decorrentes da acumulação do capital. O tipo ideal não apresentará ostentação, evita as despesas desnecessárias e o gozo de uma vida de delicias. Ele encontra na “vocação” (trabalho) a forma de louvar e adorar a Deus sem perda de tempo. Mas o que teria feito germinar a noção de “vocação”como sentido para o trabalho ascético secular? Esta prefigura como uma das grandes perguntas de Weber neste capítulo. Diante da qual sugere e investiga inicialmente o caráter do racionalismo ofertado pelo desenvolvimento histórico, ao qual rejeita pelo fato da “história do racionalismo apresentar um desenvolvimento que absolutamente não segue linhas paralelas nos vários setores da vida”.(p.51) Desta forma finaliza o capitulo, afirmando que: “estamos aqui particularmente interessados na origem do elemento irracional que precisamente se apresenta nesta, como em toda concepção de Vocação”( p.51) o que de certa forma justifica sua investigação no capitulo V identificando a “ascese “ religiosa como elemento basilar desta nova forma normativa de vida.

Hélio Márcio Gonçalves da Silva

Os caminhos e descaminhos da “acumulação racializada de oportunidades atribuídas ao mérito”. [1]

Deixar de debater um problema, ou ignorá-lo, jamais fará com que o mesmo possa ser sanado ou pelo menos combatido. Enfrentamos no Brasil, alguns problemas que ainda carecem de debates sérios e pontuais, que inobstantes estarem sendo feitos na Academia, precisam ser inseridos nas realidades diárias de todos nós. Falo aqui do debate sobre o racismo, o preconceito e a discriminação racial fortemente enraizados na sociedade brasileira e na maioria das vezes negado ou dissimulado. Daí surge à pergunta, onde as categorias acima descritas estão mais presentes? Lembro-me do slogan de uma campanha anti-racismo veiculada na televisão que perguntava: “Onde você guarda seu racismo?” A leitura e o conhecimento da pesquisa intitulada “Desigualdades Raciais no Brasil : um balanço da intervenção governamental” do IPEA [2] , sob a coordenação de Luciana Jaccoud e Nathalie Beghin nos mostra claramente onde estão os espaços de discriminação racial e nos coloca em sintonia com o debate sobre as políticas afirmativas no Brasil.
Admitir as discriminações e os preconceitos com relação ao elemento racial no Brasil nos remete a discussão primeiramente ao confronto com o “mito da democracia racial” . A idéia das “três raças” fundadoras da nação e do povo, que aprenderam a conviver harmoniosamente e em condições de igualdade. O texto, altamente elucidativo expõe os números da desigualdade, quais sejam: desigualdade de renda e pobreza, desigualdades e discriminação no mercado de trabalho, desigualdades e discriminação na educação, de onde “depreende-se, com clareza que parte significativa das desigualdades raciais entre brancos e negros no país está diretamente vinculada à discriminação racial vigente tanto na escola como no mercado de trabalho” (Jaccoud e Beghin, 2002).
Dos elementos e categorias expostos, penso que o Estado Brasileiro deve ser o propulsor de Políticas Públicas que venham de encontro a esta realidade gritante, tendo como fundamento basilar, a tão propalada noção de cidadania:
“A cidadania se constitui pela e na criação de espaço sociais de lutas ( movimentos sociais, movimentos populares e movimentos sindicais) e pela instituição de formas políticas de expressão permanentes ( partidos políticos, Estado de Direito, políticas econômicas e sociais) que criem, reconheçam e garantam a igualdade e liberdade dos cidadãos, declaradas sob a forma dos direitos. Em outras palavras, desde sua fundação, a democracia é inseparável da idéia de espaço público.” ( Chauí, 2001, p.12)

Num contexto social, cultural e econômico, onde a legislação coativa contra discriminação se mostra ineficiente no que diz respeito à inserção do negro no mundo do trabalho, relegando a essa população os “postos menos atraentes, mais servis do mercado de trabalho como um todo ou de um determinado ramo de atividade” (Gomes, 2001 apud Jaccoud e Beghin, 2002, p.41), quais seriam as saídas para essa deficiência? Como vislumbrar outros horizontes que não o da desigualdade?
E é neste espaço público que devemos trazer presente a realidade das Políticas Afirmativas e a suas contribuições na superação e combate das desigualdades raciais. Na medida em que a questão racial se impõe à agenda nacional, torna-se fundamental reconhecer que só se combate à desigualdade por diferentes frentes ( Jaccoud e Beghim, 2002, p.41), reativamente e pró – ativamente, ou seja, enfrentando diretamente e indiretamente a discriminação e o racismo na sociedade brasileira.
Outro fator que contribui para o debate em questão é a discordância e a contrariedade existente em alguns setores da sociedade brasileira, bem como na opinião de alguns intelectuais. Segundo Santos (1997) apud Jaccoud e Beghin (2002) é possível identificar alguns argumentos neste debate: a questão da isonomia, a idéia do mérito, o fator da pobreza e o elemento da miscigenação. Além do que é muito comum ainda ouvir vozes discordantes, argumentando que tais políticas aguçariam o conflito racial brasileiro. Enfim, os argumentos contrários devem e vem sendo rebatidos vigorosamente, demonstrando que somente tratando diferentemente os desiguais, é que se pode alcançar uma igualdade distributiva entre os grupos, rebatendo a idéia reducionista do mérito, que não reconhece a excelência que o país pode ganhar incluindo pessoas capazes( pretos e pardos) de desenvolver suas potencialidades, reconhecendo que independente da pobreza real que assola boa parte da população, os negros em razão de sua marginalização histórica e muitas vezes a baixa auto-estima não conseguirão avançar sem uma política especifica de inclusão racial, e por fim as Políticas Afirmativas ligadas a raça devem atingir tanto pretos como pardos pois os dados pesquisados revelam que os dois grupos sofrem dificuldades parecidas.
O debate sobre as Políticas Afirmativas e sua confirmação temporal se torna necessário até porque numa sociedade democrática, uma de suas características fundamentais, seria a compreensão de que “a criação dos direitos” só pode realmente existir na democracia, regime político aberto às mudanças temporais, que faz surgir o novo como parte de sua existência e consequentemente a temporalidade como seu modo de ser (Chauí, 2001, p.11).
Não podemos mais nos esquivar desse precioso e elucidativo debate nacional. Algumas situações, bem como algumas ações têm sido feitas e devem ser apoiadas pela sociedade (o caso das cotas universitárias, por exemplo) se queremos de fato estender a cidadania concreta (e não só de fábula) a nossa população negra, historicamente marginalizada.
O que nas palavras de Roberto DaMata (2001, p.47) se confirmam :

“Não se pode negar o mito. Mas o que se pode indicar é que o mito é precisamente isso: uma forma sutil de esconder uma sociedade que ainda não se sabe hierarquizada e dividida entre múltiplas possibilidades de classificação. Assim, o “racismo à brasileira”, paradoxalmente, torna a injustiça algo tolerável, e a diferença, uma questão de tempo e amor. Eis, numa cápsula, o segredo da fábula das três raças...”

Viver a ingenuidade, crer exclusivamente na eficiência de medidas coativas para superar a discriminação e a desigualdade racial no Brasil, “absolutizar” o mérito como única forma de acesso a bens e serviços públicos, é continuar a acreditar no famoso “Mito da Democracia Racial Brasileira” e no mínimo perpetuar a marginalização.
[1] Termo utilizado por Guimarães (1996) apud Jaccoud e Beghin (2002), p.53.
[2] Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas.